30 de dezembro de 2011 AD
Em 1872, Robert L. Dabney, escrevendo sobre a “Teologia dos Irmãos de
Plymouth”, comentou com desalento sobre a interpretação estranha dada à
esperança criança pela “teoria do pré-advento” daquele grupo. [1] A gloriosa e
completa esperança da Escritura tinha sido reduzida a uma expectativa com
respeito ao milênio, e com um conceito equivocado de milênio. Sentimos um
desalento similar quando vemos tantos cristãos que professam crer em todo o
conselho de Deus, e professam sua fé na Bíblia “de capa a capa”, desprezarem um
aspecto importante e muito vital dela, a lei de Deus.
Se a lei for separada da graça, então a graça também desaparece, pois a
Bíblia não conhece nenhuma graça antinomiana. A obra redentora de Jesus Cristo,
e a necessidade da sua morte expiatória na cruz, atestam o caráter absoluto da
lei de Deus: ela não poderia ser deixada de lado. A obra redentora de Cristo
não acabou com a função da lei, mas antes restabeleceu o homem em obediência à
lei. Fomos redimidos, S. Paulo deixa claro, “para que a justiça da lei se
cumprisse em nós” (Rm 8.4).
Adão foi criado à imagem de Deus para exercer domínio sobre a terra e
subjugá-la aos propósitos de Deus por meio do homem como sacerdote, profeta e
rei de Deus. Como sacerdote, o homem foi ordenado a dedicar a si mesmo e as
suas atividades ao Deus trino. Como rei, o homem devia governar a terra como
vice-gerente de Deus, e, como profeta, interpretar todas as coisas em termos da
palavra soberana de Deus. Com a queda, o chamado do homem foi desviado e
pervertido, e, em vez do Reino de Deus, o Reino do Homem tornou-se seu
objetivo, e as torres de Babel têm, de uma forma ou de outra, consistentemente
ocupado suas energias.
Ao redimir e restaurar o homem à imagem de Deus, Jesus Cristo restaurou
o homem ao seu mandato de criação, para subjugar a terra por meio da ciência,
agricultura, as artes, comércio e indústria, educação, e todos os outros
empreendimentos humanos legítimos, e para exercer domínio sobre todas as coisas
em sujeição a Deus. Essa tarefa foi o propósito da lei desde o princípio. A
salvação é pela graça de Deus, mediante a fé, e a santificação é pela lei.
Porque a lei de Deus tem sido abandonada pela igreja moderna, tanto evangélica
como reformada, ela tem, em primeiro lugar,
restringido a santidade às coisas pessoais. Claramente, a santificação começa
inescapavelmente no coração do homem, mas não pode parar ali. O homem que está
sendo progressivamente santificado irá inescapavelmente santificar seu lar,
escola, política, economia, ciência e tudo o mais ao entender e interpretar
todas as coisas em termos da palavra de Deus e trazendo todas as coisas para
debaixo do domínio de Cristo o Rei. Na Escritura, a santidade não é restrita ao
homem somente, e a visão profética do Reino de Cristo é enfática sobre esse
ponto:
Naquele dia será gravado sobre as campainhas dos cavalos: SANTIDADE AO
SENHOR; e as panelas na casa do SENHOR serão como as bacias diante do altar.
E todas as panelas em Jerusalém e Judá serão
consagradas ao SENHOR dos Exércitos, e todos os que sacrificarem virão, e delas
tomarão, e nelas cozerão. E, naquele dia não haverá mais cananeu na casa do
SENHOR dos Exércitos. (Zacarias 14.20-21)
Como T. V. Moore observou, “A ideia é consagração absoluta e universal
ao Senhor”. [2]
Quando a lei de Deus é honrada, nenhum homem pode considerar-se
cumprindo os requerimentos de santidade de Deus, se ele entrega os seus filhos
a um sistema de educação ímpio para educá-los, ou se ele pensa que um estado
secular é aceitável a um cristão. A lei de Deus requer obediência de todos os
homens e instituições, em todos os tempos.
[pullquote_right] Porque a lei de Deus tem sido abandonada pela igreja
moderna, tanto evangélica como reformada, ela tem… restringido a santidade às
coisas pessoais.[/pullquote_right]
Segundo, visto que a lei de Deus é o programa de Deus para a vitória em Seu
nome, onde o antinomismo em qualquer grau prevaleça, uma escatologia pessimista
prevalecerá igualmente, pois o cerne da escatologia bíblica foi negado. A
segunda vinda e o último julgamento nos dão o triunfo da lei e do Reino de
Deus, e como ousará encarar aquele dia aqueles que já desprezam a lei de
antemão?
A história do Puritanismo na América tem muito a dizer neste ponto. A
lei, uma escatologia otimista e bíblica, e o poder social andavam de mão dadas.
O declínio de uma era o declínio de todas. A Palavra de Deus é uma roupa sem
remendos, e o homens que negam a sua lei negam sua escatologia também, e estão
privados do poder de Deus. Não é surpresa, portanto, que esta é uma era de
impotência na igreja. Essa impotência não será curada por reuniões de oração
frenética e insistente, assim como o problema dos profetas de Baal não foi
resolvido pelos gritos: “Ah! Baal, responde-nos!” (1 Reis 18.26). A fé
verdadeira significa obediência à lei, e obediência produz poder e bênção.
Deuteronômio 28 nos diz precisamente, e para todos os tempos, como as orações
são respondidas e um povo abençoado. Houve um tempo quando os magistrados civis
nos Estados Unidos, desde o presidente aos cargos inferiores, faziam o
juramento de posse com a Bíblia aberta neste capítulo, pois eles sabiam o que a
lei de Deus significa. Santidade e bênção estão vinculadas à lei, não a
exercícios religiosos (Dt 28.8, 9) que colocam a religiosidade como substituta
da fé no Senhor e obediência à sua palavra soberana.
O propósito da Chalcedon Foundation é,
entre outras coisas, restaurar o conhecimento da palavra-lei de Deus a toda
área da vida e desenvolver suas implicações para cada disciplina de estudo.
Para este fim, o estudo de Greg L. Bahnsen, Theonomy in Christian Ethics,
foi escrito. A questão, como Bahnsen coloca de forma notável, é entre teonomia
(lei de Deus) e autonomia (lei própria). O homem moderno autônomo é ajudado e
incentivado em sua apostasia de Deus pelo antinomismo da igreja, a qual, por
negar a lei de Deus, tem, na teologia, política, educação, indústria, e tudo o
mais, entregado o terreno à lei do homem caído e sem Deus, à autonomia. As
respostas à crise da era moderna são fúteis se elas referem-se à Escritura
somente como matéria de fé e então olham para as invenções do homem autônomo
para encontrar respostas. Muitos pastores têm sido menos honestos que os
incrédulos modernos, pois eles têm restringido a Escritura às questões da “fé”
e criado um mundo mítico da graça comum onde o homem antônomo e seus princípios
de lei anti-teísta prevalecem. Contra tal incredulidade e heresia, este estudo
é uma defesa importante e magistral da fé e uma extensão à sua plena força dos
direitos régios do Rei Jesus.
Rousas
John Rushdoony
26 de outubro de 1971
NOTAS:
[1] – Veja Robert L. Dabney, Discussions: Evangelical and
Theological, reprint, 2 vols. (London: Banner of Truth Trust, [1890]
1967), 1:168-213.
[2] – Thomas V. Moore, The Book of Zechariah (London:
The Banner of Truth Trust, 1958), p. 236
Fonte: Theonomy in Christian Ethics, p. xi-xiv.
Tradução: Felipe
Sabino de Araújo Neto, 31 de dezembro de 2011.
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